terça-feira, 2 de dezembro de 2014

EMBARCANDO

Chegada a hora de começar o trabalho "solitário" e afetivo de investigação pessoal: embarcamos no universo das memórias e histórias familiares.

No oeste catarinense, Jô Fornari garimpa histórias dos pais, avô, tios, primos. Durante quinze dias convive, pergunta, ouve, reflete, conclui, desconstrói, duvida, se emociona, se envolve com experiências e fatos acontecidos e lembrados desde a chegada dos primeiros imigrantes italianos no Rio Grande do Sul.

O nono, já velhinho, na barranca do rio onde sempre viveu, contemplava com a neta, já  nem tão jovem,  aquele mundaréu de água que passava.

A neta, uma viajante, contava as histórias do mar, o nono suas historias de rio.

"É verdade que a água do mar é salgada?"  perguntou o nono.

"Como as lágrimas! ", respondeu a neta , com a voz embargada e os olhos marejados. 




 

 







Em Pato Branco, no Paraná, Neri Fornari Bocchesi mantem, há alguns anos,  uma pesquisa extensa  e detalhada sobre os descendentes da família Fornari , desde a chegada no Brasil de Luigi e Madalena, em 1880.
Ela conserva um "museu" de fotos, objetos, registros , documentos e historias importantes da família. Neri  é uma das principais guardiãs da historia da família Fornari no Brasil. 
Obrigada Neri, por compartilhar conosco tantas informações preciosas.

Com Neri Fornari Bocchesi, a historiadora da família.


segunda-feira, 13 de outubro de 2014

ARRUMANDO AS MALAS

Começamos arrumar as malas quando, vasculhando e desarrumando caixas, bolsas, sacos, envelopes e gavetas,  resgatamos objetos de memória pessoal guardados e esquecidos.

 

Quando a diretora chegou pela primeira vez, conversamos, explicamos, sonhamos, refletimos. 
Em seguida, começamos os relatos pessoais a partir dos diversos objetos que nós, os atores, levamos para a sala de ensaio.


Foram quatro dias de longas contações de histórias, relatos vividos e outros apenas lembrados, desempoeirando memórias que agora irão compor a bagagem.  

Ao final, a mala estava arrumada. A linha dorsal da dramaturgia havia sido traçada, um roteiro de cenas e situações esboçado, uma bússola para que os atores pudessem se orientar e seguir seu caminho pelos próximos oito meses, apenas em companhia um do outro. A diretora os aguarda na primeira estação.


  



quarta-feira, 6 de agosto de 2014

A DECISÃO DE IR

“Para onde devem voar os pássaros depois do último céu?”
Carla Luciane Klôs Schöninger
Denise Almeida Silva


Decidimos ir quando o Prêmio Funarte Myriam Muniz 2014 abriu inscrição.
Inscrevemos o Projeto (des)pertencimento e fomos aprovados.

Demos inicio a montagem de um espetáculo teatral que se utiliza de uma vertentes do teatro de animação: o teatro de objetos, para falar de raízes culturais, imigração e memória; temas interligados pelo sentimento de (des)pertencimento, da busca pela identidade cultural  e o retorno à terra de origem, a partir  de relatos  autobiográficos  da atriz  Jô Fornari e do ator Laércio Amaral .

O ponto de partida desta montagem serão os relatos autobiográficos dos atores. 

Os relatos de Jô, partem de sua origem, que data da chegada da imigração italiana que desembarcou no Rio Grande do Sul por volta de 1800, trazendo seus bisavôs que ali se estabeleceram por vários anos. Mais tarde seus avôs, pais e tios imigraram para o interior de Santa Catarina, estabelecendo residência no oeste catarinense, onde permanecem até hoje. Ela saiu de São Domingos, cidade do interior do estado de Santa Catarina, para estudar, fazer teatro, conhecer o mundo, morar em diferentes lugares e viver longe de sua terra de origem.

Esta condição de imigrante sempre constante na vida da atriz, foi aos poucos trazendo à tona um sentimento de despertencimento aos locais onde se encontrava, o que despertou nela o interesse pela busca de sua identidade cultural, que consequentemente, levou-a para um novo interesse: o retorno à terra de origem, ao seu território de pertencimento.

Para tratar destes temas, será realizada uma pesquisa de campo, para coleta de objetos, histórias, causos, vivências e sonhos dos imigrantes italianos da família da atriz, bem como suas referências enquanto desbravadores de terras e as questões culturais, políticas e sociais que os levaram à imigração. Junto a isso será abordado o aspecto da origem colona, suas particularidades, crenças, modo de vida. E, sobretudo, o sentimento que muitas vezes assola emocional e culturalmente o imigrante: o sentimento de despertencimento. Esta pesquisa será um dos aspectos fundamentais para a construção do material poético a ser levado para a cena.

Os relatos de Laércio partem de reflexões sobre seus próprios despertencimentos, sua própria sensação de imigrante de uma terra desconhecida de si mesmo. Nascido numa cidade que deixou  aos três anos de idade e para a qual voltou pouquíssimas vezes. Assim sendo, despertence  à sua terra natal.

Na cidade onde se criou, e onde passou a maior parte de sua vida, sempre se sentiu, desde muito pequeno, um não-pertencente.

Mas além das fronteiras geográficas estão as da alma. E este é o ponto que adentrou mais profundamente no projeto: o das sensações íntimas de inadequação, as pequenas e grandes “quedas”, os tropeços e acidentes de percurso. Mas também as alegrias e  os contentamentos.  

Sua lembrança de uma “paixão platônica da infância.”, foi o fiozinho solto da memória e  a partir desta porta aberta, desfilaram memórias de um pai que já está além; causos na escola, na vizinhança e na família; os tiros dentro dos muros da caserna e tigres heróis. Ainda há gavetas a vasculhar na vivência de sua raiz cabocla, levantar histórias ancestrais, entrar em contato com este universo prenhe de drama e poesia.

Estes serão os alicerces,  a construção dramatúrgica acontecerá através de um processo colaborativo, onde atores, diretora e assistente dramatúrgico, participarão orquestrando as memórias pessoais e familiares dos atores, elaborando uma trama que transite entre o real e o fictício, a experiência e a reflexão, entre o pessoal e o universal, a partir da  exploração da linguagem do Teatro de Objetos.

 Ao tratar deste tema do resgate, a montagem não pretende abordar, necessariamente, uma volta ao lugar geográfico onde se nasce, mas sim a busca por uma identidade enquanto indivíduo, algo que sugere tocar na essência humana e, provavelmente, mítica, como sugere Mircea Elíade em “O mito do eterno retorno”.

A direção desta montagem estará a cargo da atriz e diretora, Sandra Vargas, de São Paulo.

Esta montagem não pretende ser um espetáculo sobre a vida dos atores, mas sim, um espetáculo que parte de historias reais e que se desdobram e se entrecruzam  com historias de  pessoas que saíram do lugar onde nasceram pra construir sua história no lugar que escolheram.